2007-01-11

…ainda há histórias felizes?

Ninguém dava nada por aquela relação. Estava tudo contra eles: a família, os amigos, os conhecidos, as circunstâncias. Lutaram contra todos com uma convicção de ideias fixas. Choraram, cada um para seu lado, as obrigadas separações e doíam-se da incompreensão em seu redor. O tempo, que dizem grande aliado para a cura de todos os males, inclusive males de amor, apenas acendia os sentimentos a cada dia que passava. Houve vezes, em que lutaram aberta e rotundamente. Mas depois, baixaram o tom e as razões, guardaram-nas só dentro de si. Passeavam na rua e sentiam ou parecia-lhes ouvir as vozes murmuradas e os olhares de soslaio numa crítica mordaz e invejosa, pequenina e mesquinha. Era então que se enchiam de forças ocultas, levantavam a cabeça, olhavam à volta, sem medos, e seguiam o caminho, calcando o chão, cheios de certezas. Perante passos tão decididos, a família aproximou-se, outra vez, devagarinho e os poucos amigos que restavam, os que valiam a pena, só queriam saber se, afinal, estavam felizes. Mudaram as circunstâncias e os conhecidos continuaram tão-só conhecidos.

Na sua casa, feita à sua medida, acordam juntos na mesma cama, como sempre haviam sonhado. O mundo anda lá por fora, com uma indiferença atroz, e aí giram todos os que não davam nada por aquela relação. Ele ri, quando, pela manhã, se cruzam, ela feita zombie, que o acordar é difícil, aliás, só acordará realmente, após o primeiro café curto, bem tiradinho, cheiroso. Vai decorrendo o dia, numa tranquilidade que impressiona, falam por olhares e adivinham-se os gestos. Muitos observam-nos, mortos de inveja, quando os vêem a passear, de mão dada, sem hesitações, trocando palavras, parando, de vez em quando, reparando num pormenor do jardim ou numa nuvem do céu, retomando o caminho, com a serenidade, que recuperaram, saídos dos combates travados.

Mas o momento maior do dia continua a ser a hora de embarcar no sono: fecham os olhos, para perceber que não sonham, sorriem, já às escuras, aconchegam-se e, naquele quarto, o mundo funde-se em harmonia…

Renda de Bilros, 10/01/2007

4 Comments:

Blogger Kaotica said...

Um conto de esperança na possibilidade do amor e da felicidade. Num tempo de divórcio e desentendimento nada se torna mais urgente. Adorei que tivesses escolhido este espaço de liberdade para o colocar que assim fica mais rico de espírito.
Abraço!

1:58 da manhã  
Blogger Outsider said...

Mais um belo conto, cheio de sentimento. Uma bela mensagem de preserverança na adversidade e a convicção que o amor verdadeiro vence todos os obstáculos. Gostei muito!
Beijos.

P.S.- Já agora, não sei se viste o meu comentário no conto anterior do Jorge, mas os meus avós eram de Resende. O meu avô de Covelas e a minha avó de S. Matinho de Mouros. Se calhar já nos cruzamos por lá...

2:19 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Outsider
A minha avó materna era de Covelas, mas do concelho de Baião...

4:55 da tarde  
Blogger vareira said...

Como sempre entras no meu coração...

10:44 da tarde  

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